O que são conchas

por Eduardo Schirrmeister

Seja por suas formas bizarras, cores vivas, ou pela sua ornamentação variada, as conchas são verdadeiras esculturas naturais que sempre exerceram grande atração sobre o homem. O interessante é que na natureza, na maioria das vezes a beleza é funcional, ou seja, pode servir como atrativo sexual entre indivíduos da mesma espécie ou, no caso das flores, para atrair insetos que promovem a polinização. No caso das conchas, no entanto, essa beleza é gratuita, pois a maioria dos moluscos enxerga muito mal; uma grande parte vive em cavernas ou em profundidades onde a luz não chega. Alguns vivem enterrados e têm atividade apenas à noite, e outros ainda têm a concha completamente incrustada por outros organismos.
Então por que essas formas e cores?
A Ciência ainda não tem resposta para essa questão e o que nos resta é atribuir o fato a um simples capricho da natureza.

A concha é uma formação de carbonato de cálcio encerrado numa rede protéica secretada pelo molusco que funciona como um esqueleto protegendo o corpo mole do animal.
Zoologicamente os moluscos estão divididos em cinco classes principais:
Gastrópodes: é a maior classe, onde estão os moluscos que possuem conchas em espiral; são os conhecidos caramujos, caracóis, búzios e tantas outras denominações populares. As lesmas de jardim e as lesmas do mar (ambas sem concha) também se encaixam neste grupo.

Bivalves: como o nome diz, compreendem as conchas que possuem duas valvas. São mariscos, ostras e tantas outras “conchinhas” que achamos freqüentemente nas praias.

Cefalopódes: esses animais são geralmente desprovidos de conchas, salvo poucas exceções como o Nautilus e o Argonauta. Nesta classe estão os polvos, lulas e calamares.

Escafópodes: todas as conchas desse grupo pouco conhecido têm a concha em forma de dente de elefante Poliplacóforos: esse grupo é bem menos conhecido. Esses moluscos possuem um conjunto de oito placas que cobrem o animal e podem se enrolar como um “tatu-bolinha”.

O conhecido “Bernardo-eremita” ou “maloqueiro”, uma espécie de caranguejo que vive dentro de caramujos, não fabrica a concha, ele simplesmente a utiliza para proteger a parte mole do animal.

Encontramos as conchas em todos os ambientes: nas florestas, rios, lagos, mares ou até nos jardins de nossas casas. São cerca de 80.000 espécies com enormes variações. Existem conchas com menos de um milímetro de comprimento e outras que chegam a mais de um metro como as Tridacnas do Oceano Pacífico, que podem pesar 250 quilos. Essas gigantescas conchas representam um perigo para os caçadores de pérolas, pois ficam camufladas no fundo do mar com suas valvas semi-abertas filtrando seu alimento e, se uma perna ou braço toca acidentalmente no animal, ela se fecha rapidamente prendendo de forma fatal o mergulhador. Hoje é comumente encontrada servindo de pia batismal em igrejas. Esse é um dos muitos exemplos em que observamos a concha presente na vida do Homem.

Desde a pré-história, já temos registros da utilização das conchas como ferramentas, armas e adornos. Até hoje os homens do Sudão cobrem-se de búzios em cerimônias especiais e na nossa sociedade a pérola é muito valorizada como enfeite. A pérola nada mais é que um corpo estranho que se aloja dentro de algumas espécies de bivalves que vão secretando uma substância chamada nácar, que acaba por envolver completamente a partícula formando assim essa verdadeira jóia.
Mais tarde, o molusco e sua concha começaram a ser usados para produção de remédios, rações e tinturas. A púrpura, tintura avermelhada extraída de molusco de mesmo nome, foi muito importante nas relações comerciais da Europa da Idade Média. Mais tarde foi substituída por tinturas convencionais.
Na religião, a concha também está sempre presente, muitas vezes ligada ao símbolo de virilidade e longevidade, ou no caso da Índia e das Ilhas Fiji, acredita-se que seus respectivos deuses vivam dentro de determinadas espécies de caramujos considerados sagrados. Na religião católica a concha aparece, por exemplo, na passagem bíblica do batismo de Jesus.

A presença das conchas nas artes é enorme. Na Arquitetura, ela aparece estilizada de forma constante por grandes mestres e colecionadores como Gaudí e Frank Lloyd Wright. A Escultura barroca européia é cheia desses elementos, vide obra de Pierre Puget no século XVII. Botticelli, Del Zucchi, Van Der Ast e Rembrandt são exemplos de grandes pintores e amantes do assunto que retrataram as conchas em suas telas. Na Literatura, o fantástico mecanismo hidráulico da concha do Nautilus, em que o molusco injeta ou retira gases de um labirinto de câmaras, fazendo o animal subir ou descer a profundidades de mil metros nos oceanos, foi inspiração para o submarino de mesmo nome em “Vinte mil léguas submarinas” de Julio Verne. O Nautilus também foi o nome do primeiro submarino nuclear lançado ao mar em 1954 pelos Estados Unidos. Aliás, diz-se que Albert Einstein, depois de estudar uma concha de Nautilus, teve algumas noites de insônia, porque a espiral logarítmica que rege o crescimento da concha é a mesma que Descartes demonstrou em 1638, dizendo ter encontrado o modelo de crescimento contínuo sem modificação de

 

estrutura.

Na África oriental, pequenos búzios eram usados como moedas (com vinte mil conchas um homem comprava uma bela esposa!) e esse procedimento foi muito usado em diferentes regiões e épocas. A partir daí, a concha passou a ser símbolo também de opulência e riqueza e até hoje aparecem cunhadas em faces de muitas moedas e selos.

Em relação à alimentação, mariscos, ostras, vôngoles, vieiras, scargots e outros foram sempre muito apreciados. Até os primeiros habitantes do território brasileiro utilizaram o molusco como principal fonte de alimento, antes mesmo da prática da caça. Temos hoje esses dados graças á arqueologia e a paleontologia modernas que, por sinal, se baseiam largamente nas conchas para seus estudos, pois esses animais são de fácil fossilização e datação.

O colecionismo e o amadorismo são atividades também muito antigas na vida do homem e que apresentam sempre histórias curiosas. Conta-se, por exemplo, que no Mar da China encontrava-se uma das conchas mais raras do mundo da época, o Epitonium scalare. Alguns ávidos chineses produziram réplicas perfeitas dessa concha com massa de arroz e venderam essas peças falsas para colecionadores da Europa. Hoje, com o advento do mergulho, foram achados milhares de exemplares tornando-a assim uma concha comum. Em compensação as réplicas de massa de arroz são consideradas verdadeiras obras de arte e valem uma fortuna!

No Japão, o colecionismo é cada vez mais freqüente, pois tornou-se símbolo de status entre executivos do país, já que tradicionalmente era uma atividade exercida por todos os imperadores. Através principalmente das doações, as maiores coleções do mundo estão hoje nos museus espalhados pelo globo. No Brasil, a principal pertence ao Museu Oceanográfico de Rio Grande, no Rio Grande do Sul, mas existem também grandes coleções particulares. Talvez por tudo isso, ou simplesmente por serem belas, existam cada vez mais amadores interessados em colecionar e entender esse mundo fascinante.

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